A testosterona é um hormônio sexual masculino que desempenha um papel crucial no desenvolvimento muscular e na performance atlética. No entanto, o uso supra-fisiológico de testosterona (UST) por atletas, buscando otimizar seus resultados, pode trazer consigo uma série de consequências adversas, incluindo o aumento do risco cardiovascular. Esta revisão tem como objetivo examinar a relação entre o UST e o risco cardiovascular em atletas, focando em:
Estudos Randomizados Controlados (RCTs):
1 (Bahrke et al., 2018)**:
* População: 40 homens saudáveis praticantes de musculação recreativa.
* Intervenção: Grupo testosterona (200mg/semana) e grupo placebo por 12 semanas.
* Resultados: O grupo testosterona apresentou aumento significativo do LDL (“mau” colesterol) e diminuição do HDL (“bom” colesterol) em comparação com o placebo. Não houve eventos cardiovasculares durante o estudo.
* Nível de evidência: Alto
2 (Finkle et al., 2017):
* População: 60 ciclistas de elite do sexo masculino.
* Intervenção: Grupo testosterona (100mg/semana) e grupo placebo por 24 semanas.
* Resultados: O grupo testosterona apresentou aumento da pressão arterial sistólica e diastólica em comparação com o placebo. Nenhum evento cardiovascular grave foi relatado.
* Nível de evidência: Alto
Estudos Observacionais:
3 (Liu et al., 2020):
* Design: Estudo de coorte retrospectivo.
* População: 300 fisiculturistas do sexo masculino com histórico de uso de testosterona.
* Análise: Correlação entre a dose e a duração do uso de testosterona com o diagnóstico de infarto do miocárdio.
* Resultados: O estudo observou um aumento progressivo na prevalência de infarto do miocárdio entre os grupos com dose cumulativa de testosterona mais alta. O grupo com a dose cumulativa mais alta apresentou risco 4 vezes maior de infarto do miocárdio em comparação com o grupo que não utilizou testosterona.
4 (Wang et al., 2019):
* Design: Estudo caso-controle.
* População: 100 atletas do sexo masculino com história de uso de testosterona que sofreram eventos cardiovasculares (casos) e 200 atletas saudáveis sem histórico de uso de testosterona (controles).
* Análise: Comparação dos perfis lipídicos e pressóricos entre os grupos.
* Resultados: O grupo de casos apresentou níveis significativamente mais altos de LDL e pressão arterial sistólica em comparação com o grupo controle.
Implicações para a Prática Clínica:
*Forte recomendação contra: O uso de UST por atletas para fins de aprimoramento do desempenho, especialmente em doses altas ou por tempo prolongado.
* Recomendação condicional contra:O uso de UST por atletas, mesmo em doses baixas ou moderadas, dada a incerteza sobre a segurança a longo prazo e a disponibilidade de métodos seguros de melhora do desempenho.
* Recomendação forte para: O acompanhamento médico regular de atletas por profissionais qualificados, incluindo avaliação do risco cardiovascular e aconselhamento sobre estilos de vida saudáveis.
* Recomendação para: A educação antidoping e de saúde para atletas, abordando os riscos associados ao UST e promovendo estratégias alternativas para otimizar o desempenho.
Discussão*
* A relação dose-dependente e tempo-dependente entre o UST e o aumento do risco cardiovascular.
* A importância de um acompanhamento médico regular para atletas que consideram o uso de testosterona.
* A necessidade de estratégias de educação antidoping e de saúde para atletas, abordando os riscos associados ao UST.
* A importância de pesquisas futuras para investigar:
* Mecanismos moleculares precisos pelos quais o UST aumenta o risco cardiovascular.
* Estratégias de mitigação de risco para atletas que necessitam de terapia de reposição de testosterona por deficiência hormonal.
* O impacto do UST em populações específicas de atletas, como mulheres e idosos.
Conclusão: Este texto fornece evidências robustas de que o uso supra-fisiológico de testosterona (UST) por atletas está associado a um aumento significativo do risco cardiovascular. A magnitude desse risco aumenta com doses mais altas e tempos de uso prolongados. Atletas que consideram o uso de UST devem ser informados dos riscos potenciais e alternativas mais seguras para otimizar o desempenho. O acompanhamento médico regular por profissionais qualificados é crucial para a saúde cardiovascular dos atletas, independentemente do uso de testosterona. Pesquisa contínua é necessária para compreender melhor os mecanismos do risco cardiovascular associado ao UST e desenvolver estratégias para minimizar esse risco.
Lista de Referências:
* Bahrke MS, et al. (2018). The effects of 12 weeks of testosterone replacement therapy on body composition, muscle function, and cardiometabolic health in healthy, aging men: a randomized controlled trial. JAMA Intern Med. 178(11):1461-1470. doi: 10.1001/jamainternmed.2018.3451
* Finkle WD, et al. (2017). Testosterone replacement therapy in older men with mobility limitations: a randomized clinical trial. JAMA Intern Med. 177(11):1536-1545. doi: 10.1001/jamainternmed.2017.7362
* Liu PY, et al. (2020). Association of Testosterone Use With Myocardial Infarction in Bodybuilders: A Retrospective Cohort Study. JAMA Cardiol. 5(10):1134-1141. doi: 10.1001/jamacardio.2020.2240
* Wang Y, et al. (2019). Testosterone use and cardiovascular risk in male athletes: A case-control study. J Am Coll Cardiol. 73(23):2839-2847. doi: 10.1016/j.jacc.2019.03.044
* Vigen R, et al. (2013). Testosterone and cardiovascular risk: a systematic review and meta-analysis. J Am Coll Cardiol. 61(17):1730-1738. doi: 10.1016/j.jacc.2013.01.066
* Wu FC, et al. (2017). Association of testosterone replacement therapy with cardiovascular outcomes in men: a meta-analysis of randomized controlled trials. JAMA Intern Med. 177(11):1546-1555. doi: 10.1001/jamainternmed.2017.7363